Obra magistral da literatura hispano-americana e um dos mais importantes romances de Alejo Carpentier — ao lado de O Século das Luzes e A sagração da primavera —, Os passos perdidos foi publicado em 1953, inspirado, entre tantas outras experiências, nas viagens do autor pelo interior da Venezuela. Embora use nomes fictícios em alguns casos, e em outros nem mesmo dê nomes, o próprio Carpentier esclarece nas notas ao final do livro quais são (ou poderiam ter sido) alguns dos cenários do romance: o rio Orinoco, o monte Autana, a cidade de Santa Elena de Uairén — a paisagem venezuelana.
Adentra-se nestas páginas como em uma selva, no encalço dos passos de seu protagonista-narrador, um musicólogo e compositor que, buscando escapar de uma existência vazia na cidade, aceita o encargo de rastrear instrumentos musicais indígenas na selva sul-americana. Nessa jornada aparentemente reversa, que parte de uma grande metrópole para desembocar na natureza bruta, ele percorre também o próprio tempo, uma constante na obra carpentiana. Passado e presente se misturam nesta viagem de regresso às origens com o intuito de chegar à época da invenção da linguagem e das suas primeiras formas — às raízes do mundo e da criação musical pura.
Espécie de Odisseu moderno que adentra o desconhecido e perigoso mundo da selva, o protagonista narra e reflete sobre a própria vida, com suas aflições, seus vazios e, principalmente, seus martírios. Emergem, então, outros dois arquétipos que perpassam a obra: Sísifo e Prometeu — os castigados.
Com uma linguagem riquíssima e fascinante, Alejo Carpentier porta o leitor selva adentro em uma travessia que vai além do espaço-tempo: é também uma viagem literária. Os ornamentos e floreios de uma escrita em seu ápice evocam centenas de referências textuais: obras de arte, objetos e culturas distantes, fatos históricos e seus protagonistas, obras literárias, etc. Uma selva textual.